Os hospitais do Serviço Nacional de Saúde (SNS) pagaram mais de 627 milhões de euros às suas equipas médicas pela realização de cirurgias adicionais, fora do horário normal de trabalho, entre 2022 e 2024. Este valor representa um aumento de 51% em dois anos e revela que a chamada "produção adicional" deixou de ser um instrumento excecional para se tornar uma prática sistemática para reduzir as listas de espera, segundo um relatório da Inspeção-Geral das Atividades em Saúde (IGAS). A auditoria, que abrangeu as 39 Unidades Locais de Saúde (ULS) e os três Institutos Portugueses de Oncologia (IPO), concluiu que em cerca de 70% dos hospitais, a produção adicional representa 30% ou mais da atividade cirúrgica total. Em três unidades – ULS Amadora-Sintra, Trás-os-Montes e Alto Douro, e Castelo Branco – este valor ultrapassa os 50%, o que significa que mais de metade das cirurgias são realizadas fora do horário regular. As especialidades de ortopedia e oftalmologia são as que representam maior peso no valor total pago, com 26% e 21%, respetivamente.
A IGAS sublinha que, embora o regime seja legalmente definido como excecional, os hospitais recorrem a ele de forma recorrente para garantir o acesso dos utentes a cuidados cirúrgicos, transformando-o num elemento estrutural do sistema.
Apenas duas das 42 entidades avaliadas não celebraram contratos internos para produção adicional.
A IGAS não emitiu recomendações formais nesta fase, mas os resultados servirão para aprofundar o conhecimento sobre a dependência do SNS deste modelo.
Em resumoO aumento de 51% nos custos com cirurgias adicionais em apenas dois anos expõe uma dependência crónica do SNS de horas extraordinárias para gerir as listas de espera. O relatório da IGAS aponta para uma falha estrutural na capacidade de resposta do sistema, que recorre sistematicamente a um mecanismo excecional, com elevados custos financeiros.