Fogo torna difícil futuro de aldeia do Fundão que ganhou nova vida com a cereja

Um incêndio que devastou a Serra da Gardunha deixou em cinzas os pomares de cerejeiras que, nas últimas duas décadas, deram nova vida à aldeia da Enxabarda, no Fundão, mergulhando os produtores locais num futuro de grande incerteza.

A Enxabarda, uma aldeia com cerca de 200 habitantes na Serra da Gardunha, viu a sua principal fonte de rendimento ser severamente afetada por um incêndio que deflagrou em Arganil e atingiu a localidade a 19 de agosto. Há mais de 20 anos, muitos dos seus residentes trocaram outros empregos pela produção de cereja, convertendo mato em pomares produtivos que revitalizaram a economia local. Agora, com dezenas de hectares de cerejais ardidos, o desânimo e a apreensão dominam a comunidade.

Os testemunhos dos agricultores espelham a dimensão da tragédia.

Sara Martins, de 42 anos, que seguiu os passos da mãe, viu a sua família perder entre sete a oito hectares de pomares, além de outros oito hectares de árvores jovens que ainda não produziam. Para além da perda direta, Sara alerta para os danos colaterais nas árvores que sobreviveram, como os gomos florais queimados, o que compromete a colheita do próximo ano, e o risco aumentado de pragas devido à perda de polinizadores.

A produtora lamenta ainda a falta de planeamento e gestão florestal que poderiam ter mitigado o avanço das chamas.

O sentimento de perda é partilhado por outros produtores. Gabriel Martins, de 58 anos, perdeu 40% da sua produção de mirtilos e entre quatro a cinco dos seus 15 hectares de cerejais, antecipando "seis anos difíceis" até que novas árvores deem fruto. José Pereira, com mais de metade dos pomares destruídos, confessa não ter vontade de recomeçar, embora se sinta obrigado a fazê-lo pela sua família. Patrique Martins, que perdeu três dos seus 40 hectares, considera-se dos "mais afortunados", mas está demasiado desmotivado para iniciar o levantamento dos prejuízos.

A cereja "deu a alma à Enxabarda", como refere o produtor Luís Ribeiro.

Agora, entre a dor da perda e a incerteza, os agricultores enfrentam a difícil decisão de avaliar se vale a pena recomeçar a partir das cinzas.

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