Cinema Português: Entre o Legado, a Crise das Salas e o Futuro Digital



O cinema português reflete sobre o seu passado e futuro com a notícia do falecimento do cineasta Manuel Paula Dias, aos 90 anos.
Natural de Aveiro, Dias foi uma figura central na documentação da vida e tradições da sua região, especialmente nas décadas de 1960 e 1970.
Dividindo a sua vida entre a indústria de fundição e a paixão pelo cinema, criou um valioso arquivo audiovisual com obras como o documentário “Sal, Duro Sal”, que retrata a dureza do trabalho nas salinas. Juntamente com outros cineastas como Ernesto Barros, integrou o “Grupo de Aveiro”, um núcleo que marcou o cinema não-profissional da época e deixou um legado profundamente ligado à identidade cultural local.
Este olhar sobre o património cinematográfico contrasta com a crise atual do setor da exibição em Portugal. Desde o início do ano, o país perdeu 46 ecrãs de cinema, um fenómeno que evidencia a crescente preferência do público pelos serviços de streaming em detrimento da experiência em sala. As críticas apontam para o esgotamento do modelo dos cinemas em centros comerciais, a falta de qualidade na projeção e a programação uniformizada das grandes cadeias.
A resposta do Governo, com a criação de um grupo de trabalho, é vista como tardia, enquanto 174 concelhos continuam sem acesso regular a sessões de cinema, um cenário descrito como “desertificação cultural”.
A transição para o digital é também visível no percurso dos filmes nacionais de sucesso. Exemplo disso é “O Pátio da Saudade”, realizado por Leonel Vieira, que se tornou o filme português mais visto de 2025, com mais de 15 mil espectadores no fim de semana de estreia, e que foi rapidamente disponibilizado na plataforma de streaming Prime Video. Este movimento ilustra uma nova dinâmica de consumo e distribuição que redefine o ciclo de vida das produções nacionais. Enquanto se lamenta a perda de um cineasta que dedicou a sua obra à memória coletiva, o setor enfrenta uma encruzilhada.
Por um lado, o encerramento de salas ameaça o ritual social do cinema; por outro, a resistência de cineclubes e salas independentes, aliada às novas janelas digitais, aponta para possíveis caminhos futuros, num equilíbrio entre a preservação da herança cultural e a adaptação a uma nova realidade.













